domingo, 7 de agosto de 2011

O moço que veio de longe

Ele veio de longe em lombo de um alazão, trazia apetrechos pessoais e um pequeno baú de contra peso. Após romper a porteira da Fazenda do Engenho Velho, foi bater à porta da sede, onde uma guria, como se diz no sul, contando com uns quinze anos, nada mais que isso, o atendeu.
- Quero falar com proprietário!
Manifestou o recém chegado.
- Ele não está!
Retrucou a guria.
- Não tenho pressa, eu espero!
Com um sorriso faceiro, a mocinha se afastou pelos corredores do casarão e o viajante caminhou sem pressa com sua montaria até a sombra de uma árvore, onde sentou-se e ficou a espera do proprietário.
Não demorou muito, Coronel Rossi adentrou o pátio da fazenda e mesmo antes de qualquer apresentação, foi logo perguntando:
- Em que posso servir o jovem viajante?
- Careço de pouso por uma noite. Amanhã, bem cedo, sigo viagem para o sul.
Respondeu o forasteiro.
- Se vem em missão de paz, pode desencilhar o cavalo.
Autorizou o Coronel.
Sem mais esperar, Cassiano desfez-se da montaria, jogou água no lombo do alazão e após soltá-lo no pasto, caminhou até a varanda da fazenda, sempre carregando o  inseparável baú e ali ficou de papo com o Coronel.
O proprietário da Fazenda do Engenho Velho gostou do forasteiro e pelo olhar, sua filha Marina, muito mais ainda. Perguntado sobre o que continha naquele pequeno baú, Cassiano respondeu:
- Tudo que herdei de meu pai está dentro desse baú, no entanto, atendendo a um pedido seu, somente posso abri-lo quando não tiver mais esperança de nada na vida. Até o dia de hoje, não cheguei a tal ponto!
Diante da explicação pormenorizada, ninguém mais falou no baú e o pouso que deveria durar apenas uma noite se alongou por mais tempo e ao final de dois anos Cassiano já havia se casado com Mariana e os dois aguardavam ansiosos a chegada do primeiro neto do Coronel.
Mais alguns anos, Coronel Rossi saudoso de sua esposa que morrera quando do nascimento de Mariana, cansou-se da vida e embarcou nas asas de um morcego que atravessou seu caminho e foi-se para junto da falecida.
Quis o destino que Cassiano, que na verdade buscava apenas pouso para uma noite em terras da Engenho Velho, acabou se casando com Mariana e por conseguinte abocanhando todo império do Coronel Rossi.
Coronel morto, coronel posto. Não demorou muito e Cassiano virou Coronel Cassiano e da varanda da sede passou a comandar todas as atividades da Fazenda do Engenho Velho e a articular a política local.
Os dois filhos do coronel, fruto de sua união com Mariana, escolheram caminhos diferentes: O mais velho viajou para capital e formou-se advogado, o mais novo não arredava pé da fazenda, não tinha nenhum apreço pelo trabalho e quase sempre era visto acariciando o baú que o pai herdara e que despertava grande curiosidade a todos os freqüentadores da fazenda.
Quando tudo parecia tranqüilo, a morte repentina de Mariana abalou as estruturas da fazenda, levando o coronel a baixar guarda e deixar a Engenho Velho, exclusivamente, em mãos de empregados. Era comum vê-lo em sua rede olhando para o teto e falando às aranhas, até que certo dia, no embalo do vai e vem do balanço ele adormeceu e acordou nos braços da eternidade, provido de um par de asas brancas.
O filho mais velho, já com a vida encaminhada na capital, desistiu da herança em favor do irmão. O irmão mais novo, porém, desejoso de desvendar o mistério do baú, não demorou dois anos, já havia perdido tudo que herdara e finalmente era chegada a tão esperada hora.
Aberto o baú, tudo que continha em seu interior era um pequeno retângulo de granito bruto com a seguinte frase: O homem somente está derrotado, quando perde a coragem de lutar.
Guiado pela frase do baú, o filho do coronel foi à luta e a última notícia que se teve, dava conta de que ele pintava pardais de verde e os vendiam como se fossem periquitos, em uma feira clandestina de beira de estrada.
Quem vive na ilusão de encontrar um pote de ouro no fim do arco íris, está fadado a nunca realizar seu sonho 
    

07/08/2011


4 comentários:

  1. Fantástica fábula rural, em delicioso estilo narrativo. Um de seus melhores textos, Tony. Parabéns.

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  2. Texto muito gostoso de ler. Bem sabemos que a coragem em lutar pelos objetivos pode transformar uma vida aparentemente derrotada em grandes realizações. Abraços.

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  3. Aposto como o "CORONEL E O LOBISOMEM" foi sua inspiração. A criatividade literária explícita, nos conduziu a um maravilhoso voo de reflexão. Aquele que não luta pelos seus ideais, já nasceu derrotado!
    Abraços.
    Antônio Fonseca

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